domingo, 16 de outubro de 2016

#233 - "Um dia mais, sou menos que era» (José Bento)

Um dia mais, sou menos que era
há momentos: rasurei o rosto
a barba que me embuça
sem imaginação nem sono.

Mas ela não se rende. Continua
a vegetar, raiz no sangue,
a mancha que parda punge
na máscara. E derrama-se.

Esta chaga não dói, ao supurar
contra o metal contrário:
é um mênstruo inesgotável,
servil, embora másculo.

Narcisismo ancestral, a matutina
perseguição aos pêlos,
enquanto o olhar comina o insulto
dos anos que fluem sob o espelho.

A pele não repulsa nunca a lâmina:
nem ao ser já pedra musguenta
e, ao despedi-la, outros receiem
que dela ainda esta erva cresça.



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